Minimalismo, um manifesto.

 Música para leitura: Silent Flight, Sleeping Dawn - MONO

Minimalismo, um manifesto.

Mínimos, pois somos pequenos e insignificantes perante o universo, e nesta tanta insignificância, não gastaremos nosso tempo com coisas supérfluas e irrelevantes.

Mínimo, pois queremos minimizar os impactos negativos nas nossas vidas.

Mínimo, pois queremos minimizar os grilhões da sociedade e libertar nossas almas para o que realmente desejamos criar: Nós mesmos.

Minimalistas, pois queremos maximizar os afetos, os desejos, os objetivos e os sonhos, e lutar por esses sonhos, crer arduamente nestes sonhos, com a capacidade de realiza-los, e não os manipular ou ser manipulado por eles. Queremos expandir nosso espaço, dançarmos nos quartos, já sem entulhos, nos olharmos no espelho, encarar-nos no fundo dos olhos e gritarmos para todos ouvirem aquela felicidade de finalmente estarmos confortáveis com nós mesmos. De termos espaço fora de uma sociedade do consumo que nos enjaula, de todo quarto vazio ser completo, recheado e confortável.

Crescer numa classe e num estilo de vida em que a mansão é um desejo, que o carrão é quase uma obrigação e que a ostentação parece que virou uma ditadura molda nossa mente no: Quanto mais, melhor. Quanto mais, menos chances de perder.

Então nós recheamos nossas casas, nossos armários, nossas garagens e nossas redes sociais com tudo de mais [in]útil, com tantas coisas, menos de nós mesmos.

Perdi as contas de quantas vezes meu quarto foi um ambiente tão pesado e desagradável que desejava dormir na sala, achando que o ar de lá ia ser mais confortável e aberto, também quantas foram as vezes que me olhei no espelho com tantas roupas diferentes, por tantos ângulos diferentes, com todas as lentes possíveis dos diferentes óculos (de grau e de sol), pra no fim não achar um EU por trás de tanto desconforto. Quantas vezes olhei minha garagem esperando que um Mustang se materializasse, por bem ou por mal, naqueles metros quadrados. E minhas redes sociais que eram tão vazias do que tanto procurava: Dos likes, das interações, dos comentários, dos elogios. Ah e como quis tantos elogios.

E tão recheada era esta casa e estes cantos, para no final, não ter um pingo meu em nenhum destes lados, em nenhum daqueles reflexos. Tudo era tão oco, que lhe faltava essência, tanto que “Minimalismo” anda caindo em controvérsias e “Essencialismo” anda tomando seu lugar, pois é isto que é: O essencial. Ter o que é preciso, somente o que nos conforta, o que nos é útil, o que nos é agradável. O que acrescenta o caminho de criação de nossa essência.

Então comecei a colocar tudo fora, cada canto que não era meu, cada camiseta que ficaria extremamente mais bonita em outro alguém, todo utilitário que seria trilhões de vezes mais útil na mão de outra grande alma, toda peça que esquentaria, reconfortaria e tiraria o sorriso para outro alguém, muitas vezes um irmão que nos dias corridos, cansativos, jamais teria a prioridade de comprar algo como aquilo.  Alguém que sorriu e aceitou. Espero que esteja bem, irmão guerreiro. E muito quentinho, por sinal.

Então eu me achei.

Olhei num quarto e achei meu espírito em cada canto.

Olhei-me no espelho, achando eu mesmo, pela primeira vez em dezenove anos, talvez.

(19 anos é muito tempo na vida de alguém pra não conseguir se olhar no espelho).

(E muito dramático também).

Cada um destes cantos ficara, finalmente, tendo sentido. As paredes tão vazias nunca foram tão completas e repletas. Os armários nunca faltaram (também espero chegar o dia que nunca faltarão a ninguém), mas agora estão ali: Mais arrumados, do que nunca. A pequena pilha, agora tão pequena que qualquer avó ficaria receosa. Ali estava. Tão mínima e tão essencial.

E essa súbita vontade, estranhamente repentina, mas estranhamente reconfortante, começou a tomar posse do meu ser, continuou se alastrando: Saiu do guarda-roupa, saiu do quarto, saiu das prateleiras e se apossou da casa toda, nos espelhos e na garagem, nos celulares e nas redes, no escritório e no mundo ao redor.

Os likes que não vinham, ou que vieram depois de muito tempo, se tornaram apenas aquele: “Obrigado pelo carinho, mas há algo além disso, há uma história por trás da superficialidade”. Os desejos viraram pelo contato, pela conversa, pela troca de ideias. Os likes foram para projetos, para amigos, para grupos, para coisas que amei e vou ter prazer de amar de novo, quando as esquecer e lembrar outras vezes.

E então me desprendi de um “eu” sufocado para um “eu” libertado: Alguém que finalmente encaixou todas aquelas partes, tão distantes e tão vazias, para formar um todo.

Sempre tive tudo que precisei, mas ele estava tão escondido atrás de coisas inúteis, que nem percebia.

Minimalismo não é aceitar qualquer coisa.

Minimalismo é colocar limites sobre os outros e sobre nós mesmos. É um caminho que te ajuda a falar “Agradeço, mas não”, ou simplesmente “Não”.

Minimalismo não é sobre jogar suas coisas fora. Essencialismo é saber que você não precisa de mais no meio de tanta abundância.

Minimalismo não é sobre trocar as suas coisas por outras, por uma estética: É por ter coisas que caminhem com você, que não te hipnotizem, te guiem, nem te sufoquem. Coisas que te acompanhem, que são parte de você.

Minimalistas, pois aproveitaremos cada trecho, cada escrita, cada poesia, cada beijo, cada dança, cada amor, cada abraço, cada frustração, cada passeio no campo, cada folha segurada, cada amor não correspondido, cada carta, cada café, cada camisa, cada nota de violão, cada palavra, como se fosse essencial para nós, pois será.


Cada trecho de nossa vida, um manifesto.

Nunca saberei me expressar de forma tão boa quanto num manifesto, mas o que aconteceu com o manifesto de outras gerações? Foram rasgados, queimados e transformados em cinzas

Se nada disso te completar, não espere a próxima geração:

Rasgue, queime e transforme em cinzas este texto.

Ele não é essencial para você.

Ou talvez, ainda não.

 

 

Minimalismo, um manifesto.

O essencial, um manifesto.

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